Num dia
desses deparei-me com a frase abaixo sendo compartilhada nas redes sociais e
fiquei com um incômodo ao pensar no significado por trás de uma simples afirmação.
Tanta coisa
solta hoje em dia nas redes sociais, muita coisa compartilhada sem que nem
tenhamos lido direito e refletido mais profundamente sobre aquilo. Com certeza
todos nós já fizemos isso alguma vez.
Mas essa
frase me incomodou em especial, talvez porque me fez pensar sobre algumas coisas que considero
muito importantes para nós e para a educação das novas gerações:
- O que é ser
feliz? ?
- Qual
felicidade buscamos??
-Será que
devemos educar para essa felicidade propagada atualmente??
Talvez uma
das coisas que primeiro pensemos, se nos perguntarem o que queremos para os
nossos filhos, será: que sejam felizes! Eu mesma sempre penso e falo isso.
Mas o que é
ser feliz? Será que alguém é feliz 24 h. por dia?
Lendo esses
tempos atrás um livro sensacional chamado “A Arte da Vida”, do Bauman, (já
viram que sou fã de carteirinha desse sociólogo velhinho de 87 anos , não é
mesmo?) me deparo com uma interessantíssima discussão sobre a felicidade. Na
atualidade se veicula que a felicidade e o
dinheiro são quase irmãos siameses. Bauman cita no livro inúmeros relatórios de
pesquisa que comprovam que a melhora dos padrões de vida está associada não a
um aumento, mas a um DECLÍNIO do bem-estar subjetivo.
A partir do
momento que se tem o essencial, a felicidade do milionário não é maior que a da
classe trabalhadora!
Mesmo que
você se assuste, pensando em como seria feliz vivendo sem trabalhar, o ano todo
num iate de luxo nas Ilhas gregas, aumentar renda comprovadamente NÃO aumentaria a sua felicidade.
Estive
pensando nisso também ao acompanhar as notícias do "ex-astro mirim”, Justin Bieber, no Brasil por esses dias. Com todo o dinheiro do mundo, sai a noite desvairado
buscando diversão, que vai do sexo sem compromisso a transgressão, “pichando muro
para se sentir feliz..." Ou o empresário paulista em depoimento veiculado em vídeo
pela Veja, buscando criar uma identidade do mais-feliz-bem-sucedido-do-mundo
com roupas, carro importado, champanhe (mesmo que prefira vodka,rs). Tudo isso
para aparentar ou buscar a felicidade eterna...
Não acredito
nesse sentido de felicidade que é alardeado na nossa pós-modernidade. Felicidade
do EU em primeiro lugar.
Segundo a
frase que citei no início desse texto, subentende-se que, se não é errado o que me faz feliz EU posso transgredir o limite do outro. Se EU
for feliz não importa a felicidade do outro... A felicidade hoje vem sendo
atrelada a duas bases sem sustentação: a primeira é que eu devo ser eternamente feliz, sem ser
frustrado nunca, e a segunda que essa felicidade pode ser comprada nas prateleiras dos
supermercados do consumismo...
E aí penso
como muitas de nossas crianças vem sendo educadas...
Nunca vou esquecer do meu
aluninho, há muitos anos atrás, um “anjinho” de 5 anos, com lindos cabelos
loiros, que me ameaçava todas as vezes que tinha que cumprir alguma coisa que
não gostava: “ se você me mandar fazer isso vou dizer para o meu pai que você
me bateu...” E o pior é que eu corria o grande risco de o pai acreditar. Na
mesma turminha fui ameaçada por uma mãe que acreditou na história da filhinha
de 5 anos, que eu havia jogado a filhinha angelical (pasmem!!) dentro do vaso
sanitário!!! "Detalhe", as crianças não são anjos e também mentem...
O mesmo pai e mãe que compravam um presente
por dia para que os pequenos aceitassem quaisquer regras, como comerem
razoavelmente bem, ou irem a escola. Não podiam ser contrariados, não podiam se
sentirem infelizes os pobres “tiranos”... Qualquer episódio da série Super
Nanny comprova tudo isso em poucos minutos.
Junto a essa
busca incessante pela “felicidade” atrela-se a ideia de prazer. A grande máxima
é : “Se me der prazer serei feliz, se for feliz é certo”. As consequências disso
tudo, começando na infância e percorrendo a história das vidas, serão
intercorrências muito complicadas para nossa sociedade.
Será que
algumas alarmantes realidades do nosso tempo, tão desprovido às vezes de
humanidade, tão violento, não tem a ver com isso também? (e a inúmeros outros
fatores que não me cabe aqui analisar).
Alguns dias
atrás saíram índices que comprovam um
aumento em 20% dos casos de estupro contra mulheres no Brasil. Não dará prazer?
Não trará felicidade individual, mesmo que momentânea, mesmo que independente
do outro? E o corpo da mulher mais uma vez é considerado objeto...
Os índices
de medicamentos, drogas “lícitas ou ilícitas” para as “dores emocionais” que aumentam
vertiginosamente a cada dia também apontam para essa realidade. Não fui
frustrado na infância, não posso ser “infeliz”, não posso sentir dor... E nos
laboratórios se cria a ilusão da felicidade eterna, mesmo que vinda de um
comprimido colorido... Uma amiga ginecologista me disse, tempos atrás, que aparecem inúmeras
adolescentes no seu consultório pedindo anti-depressivos porque terminaram o namoro
na semana passada. E ela responde, talvez sem encontrar eco: "menina, sofrer por
amor faz parte da vida e do seu crescimento." E muitas seguem para o
consultório ao lado, na busca da cura fácil para as dores de amores...
Detesto qualquer pseudo-teoria educacional que
diga que as crianças não podem ser frustradas nunca. Nossa vida tem momentos
acinzentados, preto e branco, sépia e coloridos também, e a vida de nossos
filhos igualmente. Devem aprender a perder, a sofrer e a sentir dor, mesmo que
nossa tendência de proteção queira muito poupá-los, mas a vida não os poupará.
Faz parte da
vida, do adulto e da criança, sentir medo, ansiedade, ser frustrado, receber
vários "nãos", vivenciar a morte e a finitude, seja de relacionamentos, seja da
própria vida. E aprender a ser gente melhor com tudo isso...
Termino
citando o velhinho polonês que expressa, muito melhor do que eu, e de forma tão
simples, o que penso sobre felicidade:
“Qualquer
que seja a sua condição em matéria de dinheiro e crédito, você não vai
encontrar num shopping o amor e a amizade, os prazeres da vida doméstica, a
satisfação que vem de cuidar dos entes queridos ou de ajudar um vizinho em
dificuldade, a auto-estima proveniente do trabalho bem-feito... “nada vai
substituir “reunir-se em torno de uma mesa com comida preparada em conjunto
para ser compartilhada, ou ter uma pessoa que nos é importante ouvindo com
atenção uma longa exposição de nossos pensamentos, esperanças e apreensões mais
íntimos, e provas semelhantes de atenção, compromisso e carinho amorosos...” (BAUMAN, 2009,p.14 e 15 )